Qualquer novidade sobre bem estar eu amo, você curte?
No topo de uma parede da sala, a obra do catarinense Traplev estampa dizeres que soam como mantra para Carollina Lauriano: “Sozinho a gente não vale nada”. Jornalista e curadora independente, a paulistana se dedica a pesquisar, discutir e fomentar a presença de jovens mulheres no mercado de arte, estabelecendo conexões onde, antes, havia fissuras. No endereço de 70 m² que habita há quase uma década em Alto de Pinheiros, em São Paulo, ela busca a aproximação entre trabalho e vida pessoal. Ali expõe majoritariamente peças de talentos femininos, via de regra ausentes do circuito das galerias tradicionais – uma companhia simbólica e poderosa. “Faz um ano que meu irmão se mudou e moro sozinha neste espaço. Decidi ressignificá-lo com base nos meus valores”, diz.
Apesar de considerar o acervo ainda tímido, Carollina orgulha-se do que a seleção representa. “A coleção é composta por mais mulheres do que homens. Sobretudo, por artistas racializadas”, afirma. “Contemplá-la é muito importante para mim. Mais do que museus alterarem suas condutas, a mudança precisa vir dos colecionadores. Com isso, incentivamos novos profissionais a adentrar essas instituições e a viver da arte”, reflete. Entre um canto e outro, criações de Sol Casal, Lyz Parayzo, Moisés Patrício e Jacque Faus preenchem os ambientes com boas doses de empoderamento e representatividade. “As vivências que compartilho no processo de curadoria reverberam dentro de casa. Cada obra que está aqui me inspira a continuar fazendo o que faço”, argumenta.
O imóvel, herança familiar, foi a morada de seus avós paternos. Naturalmente, a decoração emana afetividade, que surge como saudosismo e as memórias. “A história daqui deixa este lugar muito mais acolhedor. Após o falecimento dos meus avós, resolvi reformar e vir para cá com meu irmão. Agora,coma saída dele, posso explorar melhor os meus gostos e montar a minha ambientação”, pontua.
Mas nem só de arte se constitui o refúgio de uma curadora: memorabília, lembranças de viagem e de pessoas queridas povoamos interiores, finalizados depois de seis meses de intervenção, conduzida pelas arquitetas Alice Lima e Susan Smykaluk, do Sul Estúdio. “Amo viajar, visitar mercados de pulgas e antiquários. Busco itens que dialogam comigo e com os princípios que defendo”, diz. “Acho importante trazer narrativas do passado para o presente, porque elas nos ajudam a resgatar emoções primitivas que, por sua vez, influenciam nosso futuro.”
Revelar promessas, aliás, é algo que Carollina realiza com maestria. Antes de nomes como Élle de Bernardini estrearem na cena de mostras tida como oficial, a pesquisadora já havia realizado exposições independentes com ela a fim de discutir questões de gênero no fazer artístico. “O grande fruto de meu estudo é entender que a mudança está em curso. Existem outras possibilidades além da construção branca, europeia, cisgênera e heterossexual de arte. Há propostas com cosmogonia própria, que não se encaixam nesse contexto limitador”, afirma. “E nem precisam, porque partem de princípios diferentes, incapazes de se reduzir a uma categoria”, finaliza, envolta pela vozes plurais que seu lar amplifica.
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